A questão dos limites objetivos da coisa julgada consiste em saber quais as partes da sentença que fazem coisa julgada material. Como vimos, só o dispositivo da sentença, ou seja o comando do juiz é apto a revestir-se da autoridade da coisa julgada, tornando-se imutável (ou estável).
No entanto, é preciso salientar a observação de Liebman: o dispositivo não deve entender-se em sentido meramente formal, mas material, podendo o comando do juiz ser encontrado em outras partes da sentença. Ademais, os motivos, embora não façam coisa julgada, podem ser úteis para compreender melhor e interpretar o dispositivo.
O parágrafo 2o do art. 110 do CPP, ao tratar da denominada exceção de coisa julgada, determina os limites objetivos da coisa julgada, dispondo que a exceção somente poderá ser oposta em relação ao fato principal, que tiver sido objeto da sentença.
Isso exclui as questões prejudiciais, apreciadas pelo juiz incidenter tantum, que a lei considera como acessórias, e que portanto não são idôneas a revestir-se da imutabilidade da coisa julgada material. O mesmo ocorre com os motivos e os fundamentos da sentença que tampouco têm projeção vinculativa fora do processo.
O art. 469 do CPC tem a seguinte redação: “Não fazem coisa julgada: I – os motivos, ainda que importantes para determinar o alcance da parte dispositiva da sentença; II – a verdade dos fatos, estabelecida como fundamento da sentença; III – a apreciação da questão prejudicial,decidida incidentemente no processo”.
Cumpre lembrar que, no processo civil, a questão incidental pode ser decidida de forma autônoma, por meio de ação declaratória incidental, fazendo assim coisa julgada. Mas no processo penal inexistem questões prejudiciais internas, que possam revestir-se da autoridade de coisa julgada, havendo exclusivamente questões prejudiciais externas, que formam objeto de processo civil autônomo. Toda questão prejudicial, no processo penal, é apreciada incidenter tantum.
O “fato principal” a que se refere o par. 2o do art. 110 do CPP nada mais é do que o fato material imputado ao acusado, independentemente de sua qualificação jurídico-penal. As circunstâncias do crime, os elementos acessórios e complementares, não influem no fato principal descrito na imputação, pois esta é que constitui a causa de pedir que identifica o pedido acusatório e a ação penal.
Outra visão sobre os limites objetivos da coisa julgada liga-a ao objeto do processo, tal como definido pelo pedido e pela causa de pedir. O objeto da sentença modela-se sobre o pedido. O juiz deve responder ao pedido do autor, numa correlação necessária entre o pedido e a sentença. O que é objeto do processo torna-se também objeto da sentença, pelo que se pode falar em objeto da demanda, objeto do processo e objeto da sentença como de três aspectos do mesmo fenômeno.
Mas é preciso salientar que a coisa julgada alcança a parte dispositiva da sentença e mais o fato constitutivo do pedido (a causa petendi). As questões que se situam no âmbito da causa petendi se tornam igualmente imutáveis, no tocante à solução que lhes deu o julgamento, quando essas questões se integram no fato constitutivo do pedido (José Frederico Marques). Isso é particularmente importante em relação à ação penal condenatória, onde o pedido é sempre genérico (à condenação) e o fato imputado ao acusado é a causa de pedir.
Assim, quando se fala em objeto do processo, como determinante dos limites e do alcance da autoridade da coisa julgada – pensa-se na pretensão de direito material contida no pedido apresentado ao juiz, isto é no mérito. Só a sentença de mérito é idônea a revestir-se da autoridade da coisa julgada.
Em suma, os limites objetivos da coisa julgada são estabelecidos a partir do objeto do processo, isto é, da pretensão deduzida pelo autor, abrangente do pedido à luz da causa de pedir, e apreciada pela sentença.
Texto publicado na internet - Ada Pellegrini Grinover
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